RJ – Grande Rio traz o povo da rua, exalta Exu e faz ensaio poderoso

Embora tenham sido poucos os orixás a receberem enredos biográficos, o caso de Exu nos chama muito mais atenção. Mesmo citado com recorrência nunca teve um enredo só seu. Mesmo se fundamental importância nos ritos afro, Exu costumava ser tratado com muita cautela por ser orixá de muita energia e vigor. Incialmente uma escola afeita a enredos de temática afro, tendo, inclusive uma das pioneiras a trazer a Umbanda como enredo em 1994, a Grande Rio parece ter reencontrado seu lugar de fala ao homenagear Exu. Se há aqueles que tem reserva em falar o seu nome, a escola de Caxias resolveu trazer uma legião logo em seu refrão de cabeça. Apropria-se dele quando cada componente diz ser ele próprio um Exu: “Sou Capa Preta, (Sou) Tiriri”. E em seu ensaio técnico a escola de Caxias não trouxe componentes movidos pela energia exusíaca. Trouxe o SEU povo de rua.

Foto Marcelo Moura

Abrindo os caminhos de uma escola de samba, via de regra, vem a Comissão de Frente. No caso da escola caxiense, os coreógrafos são Hélio e Beth Bejani. O coreógrafo traduziu um pouco da sua expectativa sobre o bailado que elaborou em parceria com sua esposa: “(O público pode esperar o melhor. Estamos tentando com todas as forças superar o último carnaval, que foi muito legal. Creio que este será o nosso trabalho mais completo, onde vamos trazer muita alegria e muita energia. A comissão de frente vem abrindo os caminhos para escola, meu efeito principal ainda é o ser humano e estamos trabalhando muito para isso. Vamos colocar Exu no colo do povo” – Disse. Sua fala foi reiterada por Beth: “Nosso trabalho será focado nessa energia. A gente vai trazer Exu de um modo que nunca visto na avenida. Além disso, a gente tem um link muito grande com a comunidade, que é a Estamira, catadora do lixão de Gramacho, e a ligação dela com Exu”. Estamira também é personagem importante na narrativa caxiense. A catadora de recicláveis dizia falaz com o orixá através do telefone e abria suas conversas com ele dizendo “Cambio Exu! Fala, Majeté!”. A frase é parte do nome do enredo da agremiação.

Foto Marcelo Moura

Ainda no primeiro setor da Grande Rio, os repórteres Vítor Antunes e Suelen Martins conversaram com o primeiro casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira da escola. Taciana Couto declarou que o atual enredo tem apara eles um sabor especial, especialmente por conta do fato de ambos haverem sido Exu e Pombagira no último carnaval, 2020: “São entidades muito queridas e populares, mas nunca tiveram esse destaque maior aqui na Sapucaí”. Sobre a indumentária do casal, Taciana fez segredo: “Não posso falar, é uma surpresa, mas posso garantir que é uma proposta totalmente diferente do que viemos no carnaval passado”. A porta-estandarte garantiu que sua escola conta com um barracão lindo e “uma equipe extremante esforçada, que está dando tudo de si”. A moça diz estar certa de que o campeonato vem desta vez. Para seu companheiro, Daniel Werneck, a emoção falou mais alto: “A Grande Rio é minha segunda casa, é a escola que me acolheu muito bem de braços abertos, e desejo encerar minha carreira aqui. Estou muito feliz com tudo que estou vivendo dentro da escola”. Ambos asseguraram à nossa equipe que mantiveram uma dança clássica, o tradicional, mas com pitadas de dança afro, o que pode dar ainda mais personalidade ao bailado do casal.

Foto Marcelo Moura

Igualmente confiante no título está Milton Perácio, o presidente da escola: “Pra ganhar o carnaval, tem que ganhar da Grande Rio, e isso não é a gente que fala, está na boca do povo. A Grande Rio está prontinha, finalizando alguns detalhezinhos, só esperando o grande dia.”

Foto Thiago Cânepa

Desde o meado dos anos 90, a Grande Rio se notabilizou por ser uma escola plena de artistas. Figuras tarimbadas como David Brazil, Amim Khader e Monique Alfradique marcaram presença. Além destes, outra figura conhecida a estar presente foi a modelo, apresentadora e dançarina Adriana Bombom, que celebrou o retorno à Sapucaí e revelou à nossa equipe como será a sua fantasia: “Babadeira! Eu venho de Maria Navalha, venho riscando tudo naquela Avenida”. Porém, três personalidades irão estrear na Sapucaí defendendo a escola de Caxias. Uma delas é o ex-BBB Gil do Vigor, que, sobre o enredo, apontou ser “Extremante importante a dar a voz ao nosso país que é muito místico e muito religioso. Pra mim é uma honra uma gratidão!”.

Da mesma edição do BBB20, Camilla de Lucas se disse “Feliz, muito animada, ansiosa, a Grande Rio está entregando tudo com esse enredo maravilhoso. E eu acho que agora é o momento da gente resgatar tudo que perdemos de alegria durante essa pandemia e voltar com mais força ainda. E sim, sou torcedora da Grande Rio, sou da Baixada fluminense, Nova Iguaçu é logo ali do lado (de Caxias).

Outra artista a marcar presença na festa da agremiação da Baixada é a cantora e digital influencer MC Pepita:Tudo muito novo pra mim, sou como virgem nesse meio aqui. Tudo pra mim é novidade. (Sou muito grata) ao carinho que venho recebendo da família de Caxias, o carinho e respeito que a Grande Rio teve comigo”.

Pepita celebrou, também, a importância de ser uma das poucas musas trans no carnaval do Rio “Eu carrego a letra T no corpo e no coração. T de trans e de travesti. Pisar em uma avenida, para mim, é algo muito louco. É uma mostra para sociedade de que eu posso estar onde eu quiser. Estou muito feliz e ansiosa, um mix de emoções. Vai passar um filme (na minha cabeça) no dia oficial, meu coração já está disparado”. Sobre o figurino, a artista deu uma pista de como virá trajada: “Vou te encantar, uma velha feiticeira encanta a gente!” – Disse, entre risos.

Foto Waldir Tavares

Sobre o enredo, a Pepita foi muito assertiva: “Exu é movimento. Para eu estar falando com você hoje é porque ele permitiu que a gente estivesse aqui. Ele é o positivo e o negativo. Para mim ele é extremante positivo, o negativo quem pede é você, da forma como vai pedir. Sem contar que essa entrevista está sendo feita em uma encruzilhada, quer mais força do que isso? Se posso pedir uma coisa a ele é licença que ele (Exu) nos deixe passar” – Finalizou a MC.

Foto Marcelo Moura

Do carro de som da Grande Rio, Evandro Malandro foi agraciado com o Estandarte de Ouro, prêmio do jornal O Globo, no último carnaval. Perguntado sobre o suposto bicampeonato, Malandro foi humilde: “Estou preparado, mas esse negócio de falar antes da hora não acho legal. Existem muitos profissionais, muitos cantores com muito mais tempo e experiência do que eu. Eu acho que o que acontece no dia, só vamos poder ter explicação no dia (risos). Não tem como você falar ‘Fulano’ vai ser Estandarte, porque têm 12 escolas para passar, com cada cantor se preparando pra aquele momento. É lógico que, modéstia à parte, eu fico muito feliz (em estar cotado), até porque a voz do povo é a voz de Deus, mas tenho os meus pés no chão. Estamos trabalhando pra trazer um belíssimo desfile”. Perguntado sobre a importância de Exu em sua vida disse: “Exu é tudo na minha vida! Exu me leva e me traz, me acompanha em todos os momentos da minha vida. Ao dormir e acordar Exu está comigo em meus caminhos”. Igualmente esperançoso está um dos autores do samba, Arlindinho: “É um samba muito bem executado, a escola está de parabéns, rasgando a Sapucaí, é só sucesso.”

Um dos carnavalescos da escola, Leonardo Bora declarou que o desfile elaborado por ele e por Gabriel Haddad será de “Muita energia, força, todo axé da comunidade de Caxias. Contando mais esse enredo contra a intolerância religiosa, a gente vai recriar muito dessa energia de Exu.

Recriar, movimentar. Um dos itans de Exu reza que ele “matou ontem um pássaro com a pédra que lançou hoje”. Quem sabe a Grande Rio não vence o seu primeiro título ao trazer para a avenida uma temática abandonada por ela mesma no passado? Ganhando o troféu de amanhã a partir da pedra cantada em outrora. Talvez seja 2022 o ano em que, a exceção da exceção faça, do dendê, águas claras para os reis negros do Quilombo Caxias. Fala, Majeté. Cambio Exu. Desligo!

Vítor Antunes e Suelen Martins

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