E o Primeiro Tricampeonato da Beija Flor de Nilópolis veio com “A Criação do Mundo na Tradição Nagô”

 

O carnaval carioca do ano de 1978 foi marcante em vários aspectos, mas o principal talvez tenha sido o fato de que veio a acontecer pela primeira vez na Marquês de Sapucaí, local que acabou transformando-se em local definitivo de desfile das agremiações do Rio de Janeiro.

Nesse primeiro ano de desfiles na Sapucaí, o sentido do desfile foi do Catumbi em direção ao Centro, contrário à como o desfile acontece em nossos dias, o que na época veio a atrapalhar as agremiações na concentração e transporte das alegorias, já que as ruas do bairro eram estreitas e carentes de maior iluminação.

A iluminação da pista ficou deficitária, o som instalado para os desfiles falhou em várias oportunidades e para completar a torre de TV e as decorações que ornavam a pista ficaram fora da altura ideal, já que ficaram muito baixas.

Nessa nova pista de desfile não existiam estruturas permanentes, como acontece hoje em dia, sendo arquibancadas e camarotes montados através de estruturas tubulares.

Mas se pode apontar como ponto positivo nesse novo local de desfile o fato das baterias das agremiações terem finalmente conseguido dois recuos.

Dez escolas de samba desfilaram neste ano no grupo especial do carnaval carioca, mas o regulamento para esse carnaval trazia como uma das regras, que quatro agremiações por último classificadas iriam desfilar no grupo de acesso no carnaval carioca do ano seguinte e apenas duas agremiações seriam promovidas para o grupo principal em 1979.

Eram apenas dois julgadores por quesito naquela época, o que totalizava apenas 18 notas para serem atribuídas às agremiações.

Tendo sido bicampeã nos carnavais de 1976 e 1977 a grande expectativa era para o desfile da Beija Flor de Nilópolis nesse carnaval de 1978, visto os desfiles geniais apresentados pelo carnavalesco Joãosinho Trinta, atuante na escola desde 1976.

Para o carnaval carioca de 1976 a Beija Flor trouxe para a passarela um enredo em homenagem ao jogo do bicho, “Sonhar com Rei dá Leão” e para o reinado de Momo de 77 trouxe o enredo “Vovó e o Rei da Saturnália na Corte Egípciana”, quando Joãosinho Trinta pôs no desfile da agremiação nilopolitana os antigos carnavais, dois grandes desfiles que trouxeram para a comunidade nilopolitana um inédito bicampeonato.

Para o carnaval de 1978 o gênio Joãosinho 30 trouxe para a pista de desfile “A Criação do Mundo na Tradição Nagô”, alcançando com este desfile um tricampeonato, elevando a Beija Flor de Nilópolis a tornar-se a terceira escola a conseguir um tricampeonato no carnaval do Rio de Janeiro.

Esse tricampeonato foi o marco inicial para que a Beija Flor viesse a se tornar a Deusa da Passarela, visto sua história de grandes desfiles, que hoje soma um total de 14 títulos no carnaval carioca.

Novo tricampeonato a escola de Nilópolis só alcançaria de novo nos carnavais de 2003, 2004 e 2005.

No período pré-carnavalesco a grande indagação de todos os amantes do carnaval era saber se alguma outra agremiação teria força para suplantar a emergente Beija Flor, não esquecendo que Joãosinho Trinta veio para a escola sendo campeão dos carnavais de 1974 e 1975 pelo Acadêmicos do Salgueiro.

O enredo “A Criação do Mundo na Tradição Nagô” era sobre a formação do planeta terra na visão iorubá. O samba composto para este desfile, que posteriormente entraria para a antologia do carnaval, era uma fusão entre as obras de Mazinho e Gilson Dr. com a de Neguinho da Beija-Flor.

 

“…Bailou no ar
O ecoar de um canto de alegria!
Três princesas africanas
Na sagrada Bahia
Iá Kalá, Iá Detá, Iá Nassô
Cantaram assim a tradição Nagô…”

(Trecho do samba da Beija Flor de Nilópolis – Carnaval 1978)

 

 

O desfile atrasou muito para iniciar já desde a primeira escola e a Deusa da Passarela era a penúltima escola a desfilar, tendo entrado na pista de desfila já com sol alto.

Conforme o enredo da Beija Flor, o senhor do infinito Olorum ordenara a Obatalá que criasse o mundo. Os continentes foram formados por cinco galinhas d’Angola (Yaôs), o mar nasceu dos caracóis (Olokum e Iemanjá), o fogo veio de um camaleão (Xangô, Ogum e Iansã) e o céu surgiu por intermédio de pombas brancas (Oxum).

O desfile da escola notabilizou-se pelo uso de fantasias e elementos claros, muito uso do branco e tons prateados.

Laíla, na época já Diretor de Harmonia da escola, fez um trabalho perfeito, permitindo um desfile com evolução contínua e coesa.

As alegorias apresentadas pela escola nilopolitana tinham condições de apresentar um grande quantitativo de destaques sobre elas, sendo exemplo disso o carro abre-alas, imponente e com um grande contingente de mulatas seminuas e muitos espelhos, que refletiam a luz, dando uma aura prateada a todo o desfile.

Figura de destaque no desfile da agremiação, a extasiante Pinah, que logo a seguir ficaria célebre no mundo todo ao dançar com o Príncipe Charles, herdeiro da coroa britânica, durante um evento no Copacabana Palace.

O dourado também este muito presente neste desfile.

O samba mostrou-se perfeito para sustentar o desfile, tendo a bateria da escola demonstrado um andamento perfeito. O desfile foi perfeito e os gritos de “já ganhou”, vindos do público presente, levaram a escola até o final da pista de desfile.

Terminado o desfile, a crítica carnavalesca da época apontava Mangueira e Beija-Flor como agremiações favoritas à conquistar o campeonato daquele ano.

“Na passarela, a tradição do morro contra o luxo de Nilópolis”, dizia a manchete do jornal “O Globo”.

Os componentes do júri do Estandarte de Ouro conferiram à Beija Flor o prêmio de melhor escola daquele carnaval, com cinco votos.

Iniciada a apuração, Mangueira e Ilha logo estavam na frente após o escrutínio das primeiras notas no tocante ao quesito bateria, mas logo a Beija-Flor assumiu o primeiro lugar já no segundo quesito, samba-enredo, em cujo quesito foi a única agremiação a ganhar a duas notas dez.

O tricampeonato da Beija-Flor veio em definitivo com notas máximas no quesito alegorias e adereços, tendo a escola nilopolitana ficado com três pontos à frente da vice-campeã Mangueira, com a Mocidade em terceiro, a Ilha em quarto, a Portela em quinto e o Salgueiro em sexto.

Foi festa total na cidade de Nilópolis, já que este tricampeonato serviu como o início da consolidação da escola como uma das grandes do carnaval carioca.

A Beija Flor de Nilópolis voltaria a ser campeã no carnaval de 1980, mas isso já é assunto para outra coluna.

Por Sidnei Louro Jorge Júnior

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