Nelcimar Pires, natural de Campos dos Goytacazes–RJ, é um dos principais nomes do segmento Destaques de Luxo no Carnaval Carioca, acumulando uma carreira de sucesso, marcada por paixão, criatividade e talento.
Sua paixão pelo carnaval começou na infância, em meio à ditadura militar. Naquela época, as revistas como O Cruzeiro, Manchete e Fatos & Fotos eram a principal fonte de informação sobre o evento. Nelcimar colecionava as revistas e se encantava com os concursos de fantasias.
“Eu era o primeiro a ficar sentado esperando a banca abrir. Comprava tudo que tinha em relação ao carnaval. Sou da época das revistas que focavam em concursos de fantasias que era o meu interesse, porque eu era apaixonado e achava uma grande arte. Os artistas, sendo ficção ou não, envergavam um personagem. Namorava aquelas fantasias e me imagina ali fazendo como eles.”, conta Nelcimar.
A fascinação do estilista veio da curiosidade em saber como os artistas daquela época trabalhavam e como colocavam a paixão em transformar roupas em verdadeiras obras de arte. Adepto a uma competição, um dos desejos de Nelcimar era receber o tão cobiçado prêmio oferecido pela empresa Natan Joias. A empresa, pioneira no lançamento de relógios e hoje incorporada a Monte Carlo, patrocinava os grandes concursos de fantasias nos áureos tempos do evento.
“Eu sonhava em ter um daqueles prêmios, nunca pensava em dinheiro e nada além. Eu queria aquele troféu na minha mão. Era maravilhoso com uma máscara retorcida banhada em outro branco e toda cravejada em pedras brasileiras. Era uma corrida atrás deste troféu, cada um lutando da sua forma para tentar um“
Os bailes do Municipal, que marcaram época no carnaval carioca, chegaram ao fim em 1972. No entanto, a tradição dos concursos de fantasias continuou em outros clubes, como o Hotel Gloria e o Clube Monte Líbano. Alguns dos grandes nomes do carnaval, já na época, se apresentavam como “hors concours” nesses concursos. Essa categoria era reservada para aqueles que já haviam vencido cinco anos consecutivos e, por isso, não competiam mais, mas apenas exibiam suas criações como ícones da festa.
Nelcimar, fascinado pelo mundo dos concursos de fantasias, se interessou pelo significado daquele título. “Eu queria saber o que era hors concours, ai descobri que o candidato deveria ganhar cinco anos consecutivos e dai não poderia mais concorrer para dar lugar aos outros. Alguns poderiam pensar que era bobagem, mas para quem fazia não. Eram gastos que valiam a pena”, explica o estilista.
Rompendo Barreiras e Construindo um Sonho
Nascido em uma família tradicional, Nelcimar precisou superar os preconceitos da época para seguir seu sonho de trabalhar com carnaval. Em uma sociedade marcada por estereótipos, o jovem homossexual enfrentou a resistência de familiares e amigos que associavam sua paixão à homossexualidade, utilizando termos chulos e discriminatórios.
“Eles diziam que aquilo era coisa de veado, não eram palavras menos chulas que isso. Meu pai era da roça, eu entendo. Mas ele, que faleceu há mais de 30 anos, me apoiava em tudo. Eu sou homossexual mas nunca dei motivo, nunca fui de rua. Eu nunca me senti uma vergonha para eles. Sempre fui reservado.”, relata.
Inspirado por grandes nomes do carnaval, Nelcimar deu início à sua trajetória em 1980, na cidade de São João da Barra, Norte Fluminense. Sua paixão pela arte carnavalesca o levou a criar figurinos para sua irmã Katia Pires, que participava de um famoso evento da alta sociedade local.
“Posso dizer que hoje também sou desta cidade que eu amo. São anos de trabalho social lá, estes trabalhos acarretaram no título de cidadão São-joanense. Eu tenho eternizado na parede o certificado recebido pela prefeita.”, conta Nelcimar com orgulho.
Após a morte de seu pai em 1985, aos 20 anos de idade, assumiu a responsabilidade de cuidar da família. Com frustrações nos negócios e a necessidade de seguir em frente, ele vendeu os bens da família e, em 1987, decidiu criar sua primeira fantasia: “O Imperador Bizantino“.
Desfilando na Escola de Samba Congos de São João da Barra, Nelcimar deu início à sua jornada no carnaval. Ele se tornou carnavalesco da instituição e, ao longo dos anos, se adaptou às mudanças na confecção de fantasias.
“Antes era tudo muito trabalhoso, hoje em dia é muita cola. Estica-se o tecido e poucas pessoas trabalham ali. Não falo de roupa de ninguém, digo que a modernidade deu prática a você fazer um traje de gala. Agora pegam um tecido, se joga um galão, enchem de broches chineses baratíssimos e vai chapando. Não tem a coisa de antes, onde se amarrava, entrelaçava a roupa com pontos de crochê e ia criando a situação para acontecer no final.“
Em 1998, a convite do diretor da ala Paz na Portela, Seu Bené, Nelcimar desfilou em ala comercial com a irmã e a prima. O enredo era “Os Olhos da Noite” de Ilvamar Magalhães.
“Eu vim atrás do abre alas, e ficava olhando para o carro, lá estavam Wanda Bastista e Pedrinho Fernandes. Fiquei encantado, seu Bené chegou perto e me perguntou se estava gostando. Só agradecia pela realização do sonho. Então falei que o maior deles ainda conquistaria, que era estar lá no alto de uma alegoria na Sapucaí. Seu Bené sem entender, me pediu para ligar depois que conversaria comigo. Liguei sim e ele me apresentou ao presidente da Portela Carlinhos Maracanã, que viria me dar a minha primeira oportunidade no Rio“, conta Nelcimar.
Em 1999, Nelcimar estreou como destaque na Portela, que homenageava Minas Gerais no enredo “De Volta Aos Caminhos de Minas Gerais“, também de Ilvamar Magalhães. Foram dez carnavais como destaque na azul e branca.
“Sai da Portela devido a divergência com outro destaque que prefiro não citar o nome. Quando ganhei o Título no hotel Glória, a pessoa enciumada pensou que eu poderia ter tirado o prêmio dela lá e decretou que na Portela eu não ficaria, assim sai injustamente quase escorraçado de lá“.
No mesmo ano, ele conquistou Menção Honrosa no concurso do Hotel Glória, demonstrando sua força e resiliência. O episódio na Portela apenas o impulsionou a buscar novos desafios e alcançar ainda mais sucesso. Anos depois, se tornou Pentacampeão do concurso do Hotel Glória. Em 2006, a convite do empresário Mauricio Mattos, se apresentou no espetáculo Brazilian Carnival Ball em Toronto, Canadá, iniciando uma turnê de sete anos. O sucesso internacional levou Nelcimar a diversos países, como China, Cingapura, Suíça e Inglaterra.
“As fantasias possuem história, eu tiro pelas minhas. Quantas pessoas ficaram bordando seu manto? Cada um com uma parte conversando, jogando conversa fora, isso era o mais bonito que eu vivi. Não sentia a maldade que vejo hoje. Para as confecções eu fazia café, bolo e tive grandes senhoras bordando paetês, miçangas. Infelizmente boa parte delas já se foram.”, relata Nelcimar com saudade dos tempos antigos do carnaval.
Nelcimar se tornou um dos principais nomes do segmento Destaque de Luxo no carnaval carioca. Ele desfilou por diversas outras escolas, como Salgueiro, Viradouro, Porto da Pedra, Rocinha, Estácio e Vila Isabel, Imperatriz e Viradouro.
O estilista reconhece que a arte carnavalesca exige tempo, dedicação e recursos financeiros. Apesar dos desafios, ele acredita que a paixão e o apoio de quem acredita na arte são os principais motores do sucesso.
“Antigamente tinha mais apoio, principalmente após você ter um nome no meio. Eu mesmo, ganhava caixa de cola, linha dez para fazer franjas. Os camuchões (broches). Na época os broches eram feitos de carpete, feltro, algodãozinho. Tudo costurado para fazer uns trezentos. Íamos bordando com strass para fazer o desenho em alto relevo. Ai chegávamos em um broche grande para aplicar na roupa sem cola, e sim costurado. Apesar do peso era uma arte escandalosa.”, relata Nelcimar sobre os tempos antigos do carnaval.
Feliz no Rio de Janeiro, Nelcimar lamenta a situação do carnaval de Campos dos Goytacazes, sua cidade natal. A folia campista, que já foi muito famosa, passou a ser um carnaval fora de época a partir de 2009, devido às enchentes que abalaram o município. Desde 2016, a cidade não realiza desfiles de escolas de samba.
Uma Trajetória Marcante: Do Carnaval à Alta Costura
Estilista renomado, Nelcimar costura para noivas desde os seus 18 anos e mantém um atelier em Campos, onde veste damas da alta sociedade norte fluminense. Suas criações são famosas pelo requinte e toque da alta costura.
Artista multifacetado que se destaca tanto no carnaval carioca quanto na alta costura. Sua paixão pela arte o levou a construir uma carreira de sucesso, marcada por talento, dedicação e respeito às tradições. Sua mãe, Dona Tilma, é sua modelo exclusiva e o acompanha nos desfiles de carnaval até hoje. Sempre vestindo criações do estilista, ela representa a força da família e a importância do apoio na vida de Nelcimar.
Desde 2000, ele coordena concursos de beleza, como Miss Beleza Internacional, Mister Pacific e Mister Tur by Christian Oliver. Atualmente, é proprietário de uma agência de modelos que prepara jovens para a carreira profissional.
