“…Ah vira virou, vira virou
A Mocidade chegou, chegou
Virando nas viradas dessa vida
Um elo, uma canção de amor, olha vira virou, virou…”
(Mocidade Independente de Padre Miguel – 1990)
No distante ano de 1955 foi fundada a Mocidade Independente de Padre Miguel, nascida longe do centro da cidade do Rio de Janeiro.
Como uma marca registrada da escola, estava sua bateria, a pioneira a realizar coreografias na história do carnaval carioca. Em função do destaque alcançado por sua bateria com o passar dos anos, a agremiação adquiriu a fama de que era “uma bateria que tinha uma escola de samba”, algo que se ouve recorrentemente até hoje.
Foi na década de 70 que o bicheiro Castor de Andrade chegou na escola, injetando recursos o que possibilitou à agremiação tornar uma potência no meio carnavalesco, sendo que o primeiro título da escola veio em 1979.
Foi a Mocidade quem iniciou o ciclo das rainhas de bateria nas escolas de samba do Rio de Janeiro, com as figuras de Monique Evans e Adele Fátima.
Nos seus muitos anos de carnaval, um dos sambas mais conhecidos da Mocidade talvez seja o do carnaval de 1990, quando a escola efetivou uma homenagem à sua própria história com “Vira, virou, a Mocidade chegou”, que lhe rendeu o campeonato naquele ano, samba este de autoria dos compositores Toco, Jorginho Medeiros e Tiãozinho, na avenida interpretado por Paulinho Mocidade, estreando na escola naquele carnaval de 90.
Para a grande maioria das agremiações carnavalescas cariocas, a preparação do carnaval de 1990 foi bastante difícil em função da inflação alta pela qual o Brasil passava naquela época de nossa história.
Foi no carnaval de 1990 que surgiu a expressão “grupo especial” para designar o principal grupo de agremiações carnavalescas da cidade do Rio de Janeiro, grupo este que desfila no domingo e na segunda-feira de carnaval.
Os desfiles de 1989 ainda estavam na memória dos apaixonados pelo carnaval, especialmente os desfiles da campeã daquele ano Imperatriz Leopoldinense e da vice Beija Flor de Nilópolis, que para o carnaval de 1990 fizeram a escolha de enredos bastante diferentes. Como veremos oportunamente, a Deusa da Passarela, ao final da apuração no carnaval de 1990, manteve o vice campeonato, tal como foi em 1989, diferentemente da Imperatriz que ficou desta vez apenas com a quarta colocação. Imperatriz e Beija Flor para 90 permaneceram com os mesmos carnavalescos do ano anterior, Max Lopes e Joãosinho Trinta, respectivamente.
A Mocidade Independente chegou ao carnaval de 1990 como que de luto, visto o falecimento de seu eterno intérprete Ney Vianna no ano de 1989, puxador da escola desde 1974 e ainda não tinha se refeito também da perda precoce de seu carnavalesco Fernando Pinto, campeão pela Mocidade em 1985, há pouco mais de dois anos, em função de um acidente automobilístico.
Para esse carnaval a escola trouxe o carnavalesco Renato Lage em dupla com Lilian Rabelo, tendo os dois trabalhado na escola até o carnaval de 1992. Renato ainda ficou por Padre Miguel até o carnaval de 2002, ano este em que dividiu a criação do carnaval da agremiação com Márcia Lávia.
Nesse período de permanência de Renato Lage como carnavalesco da Mocidade, foram conquistados três campeonatos para a agremiação.
A Mocidade desfilou na segunda noite de apresentações, tendo sido a quarta escola a entrar na pista de desfiles, com tempo de desfile de 90 minutos, desta vez para contar a sua própria história no carnaval e exaltar suas personalidades de destaque. Foram cerca de 3.500 componentes divididos em 35 alas.
Foi uma exibição arrebatadora, num estilo totalmente diferente daquele que a escola vinha seguindo nos últimos carnavais, já que Renato Lage e Lilian, na época com sete meses de gravidez, imprimiram à escola o seu característico estilo high tech.
O desfile da escola serviu para que os carnavais mais importantes apresentados pela Mocidade até ali, fossem de novo como que revisitados, com destaque para “Apoteose ao samba” de 1958, “A Festa do Divino” de 1974, “O Mundo Fantástico do Uirapuru” de 1975, “O Descobrimento do Brasil” do ano de 1979, “Como era verde o meu Xingu” de 1983 e finalmente “Ziriguidum 2001” campeão em 1985.
À frente da escola, além de Castor de Andrade, veio o Vice Presidente da Rede Globo na época, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o “Boni”.
A comissão de frente representava o passado e o futuro, já que cada figura trazia a figura de um africano em sua parte da frente e um ser espacial na parte de trás, a cultura afro e a tecnologia.
Destaque do carro abre alas neste ano e por muitos anos seguintes, Beth Andrade, nora do bicheiro Castor de Andrade, vinha acompanhada das duas filhas. Chamou atenção neste carro além dos movimentos de muitos de seus elementos a grande quantidade de luz neon num verde cítrico. No centro do carro a estrela guia de Padre Miguel, nascida do Independente Futebol Clube em seus primórdios.
Já no primeiro setor do desfile intitulado “Em Celeiro de Bambas nasce uma Estrela – década de 60”, destaque absoluto para a ala de baianas da escola, que nas cores verde, branco e prateado vestiam a bandeira da agremiação como fantasia, num extremo bom gosto e fino acabamento. Destaque para a presença de tia Nilda, que até hoje é personalidade marcante da escola e que todos os carnavais se faz presente no desfile da escola até hoje.
Na segunda alegoria, homenagem aos baluartes da escola, Marlene Paiva era o destaque principal. O terceiro carro, predominantemente prateado, com a figura de uma grande porta estandarte, trazia casais de mestre sala e porta bandeira da escolinha mantida pela agremiação em Padre Miguel.
A bateria da escola nesse carnaval veio sob a batuta de Mestre Jorjão, com seus integrantes fantasiados como “Fôlego de Gato”.
Atrás da bateria veio a alegoria representando a favelinha de Vila Vintém, com Andrezinho, filho do lendário Mestre André que notabilizou a bateria da escola para a eternidade, como que regendo os ritmistas que vinham sobre a alegoria, que ainda trazia o trem, tão comum na vida daquela comunidade.
O primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira da escola nesse ano foram Babi e Alexandre, tendo o patrono Castor de Andrade ensaiado alguns passos com a porta-bandeira durante o desfile.
A seguir passamos a segunda virada, denominada “Notável Artista encenou a História – década de 70”, referência ao carnavalesco e artista plástico Arlindo Rodrigues, trazido por castor para a Mocidade, que com seu refinamento mudou a plástica da escola. Arlindo foi campeão com a Mocidade no carnaval de 1979 com o tema “O Descobrimento do Brasil”.
Um carro predominantemente dourado trazia os elementos característicos dos carnavais de Arlindo Rodrigues, além de trazer um busto do carnavalesco. O destaque central dessa alegoria foi Vilma Andrade.
O carro alegórico seguinte trazia em seus elementos constitutivos uma síntese dos carnavais de Arlindo Rodrigues, como “Mãe Menininha do Gantois”, “A Festa do Divino”, “O Mundo fantástico do Uirapuru”, dentre outros.
O enredo campeão “O Descobrimento do Brasil”, de Arlindo Rodrigues, mereceu uma alegoria à parte, predominantemente nas cores branca e dourada, com muitos destaques sobre o carro.
A seguir novo tripé anunciava a terceira virada, “A irreverência do artista, delirando a passarela – década de 80”, referência à chegada do carnavalesco Fernando Pinto, com seu estilo tropicalista.
A alegoria que abriu este setor do desfile trazia a representação de Fernando Pinto, numa escultura gigantesca que acenava para o público presente na Sapucaí, alegoria esta com muitos destaques, numa profusão de cores, pássaros, frutas e flores. Vera Benévolo, figura tradicional da escola, vinha como destaque neste carro.
Também com muitas cores, ao estilo de Fernando Pinto, a alegoria seguinte trazia a síntese dos enredos do carnavalesco, como “Tropicália Maravilha”, “Como era verde meu Xingu”, “Tupinicópolis” e “Mamãe eu quero Manaus”, tendo a representação de uma enorme arara na parte da frente da alegoria.
Em seqüência veio a alegoria “Ziriguidum 2001, carnaval nas estrelas”, predominantemente branca, prateada e verde, enredo campeão do carnaval de 1985, com um enorme inseto intergaláctico.
A última virada, “Década de 90 – O carnaval evolui, mas a essência continua”, tendo como alegoria o carro das ampulhetas, que marcava a passagem do tempo, trazendo como destaque Lou de Oliveira, esposa de Boni, além de outras personalidades conhecidas do mundo do samba.
Lucinha Nobre, veio na época como segunda porta-bandeira da Mocidade, ao lado do mestre-sala Jorge Luis.
A alegoria seguinte trazia grandes interrogações, com relação ao futuro da agremiação, mescla de estilos passados, presentes e futuros.
“Estrela Guia” foi a última alegoria da escola, como a luz que guia a agremiação, seu símbolo máximo. Outra alegoria de grandes dimensões, aliás, como foi o conjunto alegórico da escola naquele carnaval.
Na dispersão a platéia delirava com a chegada da Mocidade, saudando a escola com gritos de “É campeã”.
A escola teve certa dificuldade para realizar a retirada de suas alegorias da área da dispersão.
Nesse carnaval de 90, a apuração das notas foi realizada pela primeira vez na Praça da Apoteose e como já era esperado a Mocidade foi aclamada como a grande campeã daquele carnaval.
“Esse povo humilde de Padre Miguel e Vila Vintém desfilou com muita garra nessa Passarela. Aqui ela mostrou que merece nota 10. Pouco importa se o carro não pôde sair em tempo na dispersão. Seria uma injustiça não premiar essa escola com a nota 10!”
(Castor de Andrade ao final da apuração – 1990)
Terminada a apuração, voltaram no desfile das campeãs Mocidade Independente de Padre Miguel, Beija Flor de Nilópolis, Acadêmicos do Salgueiro, Imperatriz Leopoldinense, Estácio de Sá e São Clemente.
No desfile do acesso, na época denominado de grupo 1, foram campeãs Unidos do Viradouro, seguida da Acadêmicos do Grande Rio, tendo no carnaval de 1991 então desfilado no grupo especial pela primeira vez.
Por Sidnei Louro Jorge Júnior