RJ – Há 40 anos o Brasil sofria a trágica e polêmica morte de Clara Nunes

    A morte de Clara Nunes por insuficiência cardíaca ocorreu no dia 02 de abril de 1983, na Clínica São Vicente, no Rio de Janeiro, quando a cantora tinha 40 anos de idade.

    Há 40 anos o Brasil entrava em luto pela perda de uma das mais luminosas vozes ouvidas em todo o Brasil. A “tal mineira”, Clara Nunes, uma das cantoras mais populares do Brasil à época. Esta personagem era figura constante nas páginas de jornais, revistas e programas de televisão, através de sua arte, vida pessoal a até na sua morte.

    Todo o mês de março de 1983 foi recheado de especulações e teorias da conspiração que inquietou o país. Tudo começou com uma má notícia e entrou em abril com uma pior ainda, quando o público soube, no dia 2 de abril de 1983, que a sambista havia morrido. Clara foi vítima de toda sorte de boatos sobre a razão de ter entrado em coma.

    Antecedentes

    Desde 1979, quando se submeteu a uma cirurgia para retirada de um mioma que proliferava em seu útero, Clara começou a fazer tratamentos com aplicação de medicamentos no interior das varizes.
    Com o decorrer do tempo, o calibre das veias diminuiriam e, consequentemente, o vaso se fecharia.

    Um episódio emblemático ocorreu em junho de 1982. Após se apresentar no Festival Horizonte Latino Americano de Arte, em Berlim na Alemanha, a cantora telefonara para a amiga Bibi Ferreira para lhe revelar sua preocupação com as varizes. Clara teria dito à amiga que estava dançando na frente do palco quando reparou que todos olhavam para suas pernas, na altura das canelas e comunicou a amiga sobre a decisão de fazer uma cirurgia de remoção após retornar ao Brasil. Bibi Ferreira tentou convencer Clara de que a preocupação era bobagem, mas disse que ela deveria fazer a intervenção se estivesse realmente incomodada, já que a anestesia provavelmente seria local.

    Melhorar o visual das pernas acabaria se tornando uma obsessão para Clara, que sempre fora muito vaidosa. Sua preocupação ganhou relevância no seu cotidiano a partir do surgimento de varizes mais grossas, que só seriam possíveis de tratar através de uma cirurgia.

    Em 1983, o médico angiologista Antonio Vieira de Mello, foi escolhido por Clara para realizar o tratamento. Ela atribuía dores que sentia nas pernas às varizes, o que era considerado um exagero por pessoas mais próximas.

    O sofrimento da artista começou no dia 5 de março daquele ano, Clara dispensou a carona do marido, o compositor Paulo César Pinheiro, e se dirigiu a clinica São Vicente na zona Sul do Rio de Janeiro. A sambista chegou à clínica às 07:50 da manhã e foi direto para seu quarto. Os funcionários reconheceram-na e começaram a comentar sobre sua presença no local, o que deixou a cantora visivelmente irritada.

    O casal Paulo César Pinheiro e Clara Nunes

    Na clínica, além de ser reconhecida e causar euforia por onde passava, ouviu a equipe médica tentar dissuadi-la da anestesia geral. Os médicos tentaram fazê-la desistir da ideia, explicando-lhe as vantagens da peridural, e que a anestesia geral, em caso de pequenas cirurgias, pode ocasionar muitas complicações ao organismo, mas Clara foi categórica em sua resposta: “Se for para tomar a outra eu vou embora“. Eles acabaram acatando a exigência da cantora. Às 10:30, Clara se dirigiu para a sala de cirúrgica e o procedimento começou às 10:45.

    Após aplicação da anestesia em Clara, o médico começou a operá-la. A cantora havia sido anestesiada com uma mistura de drogas que consistia em halotano, protóxido de azoto e oxigênio. No decorrer do procedimento, a perna direita já havia sido operada, e a esquerda estava sendo suturada, quando o médico percebeu que o sangue estava escuro, e jorrando em grande quantidade.Notou-se houve queda de pressão arterial, o que significa que a cantora estava tendo uma parada cardíaca.

    Com varias tentativas dos médicos em tentarem ressuscitá-la, 03:40 da tarde, Clara foi encaminhada para o Centro de Tratamento Intensivo (CTI) da clínica. A cantora foi reanimada com um desfibrilador, mas não respondia voluntariamente aos estímulos, indicativo de que ela havia entrado em coma.

    Clara havia tido uma reação alérgica a algum ao anestésicos utilizado. O cérebro não suportou a pressão e um edema se formou, causando a morte cerebral imediata da paciente. Enquanto estava em coma, todo o tipo de teorias surgiu para justificar o que havia acontecido com a cantora: que ela havia tentado fazer um aborto, que estava tentando fazer inseminação artificial, que havia tentado o suicídio, que havia sido espancada pelo marido e que o problema com a anestesia, o choque anafilático que a obrigou ser induzida ao coma, havia sido causado pelo problema da cantora com álcool e drogas.

    Clara Nunes ao lado da amiga Alcione

    Com a notícia já espalhada, vários amigos artistas foram tentar visitar a cantora entre eles, a cantora Baby Consuelo, que tentou entrar com o curandeiro Thomas Green Morton (Famoso paranormal na época, e depois desmascarado como charlatão), sendo impedida pelo próprio marido da cantora, Paulo César Pinheiro.

    A principal preocupação dos médicos era que muito possivelmente, se Clara sobrevivesse, teria sequelas, devido ao fato da falta de oxigênio no cérebro. Paulo César passou a acompanhar de perto o quadro médico da esposa, junto com a família dela, que saiu de Minas Gerais para acompanhar o estado de Clara. A pedido do compositor, que mantinha a esperança da situação ser revertida, o caso foi mantido sob sigilo, mas acabou vazando para a imprensa dois dias depois. A rua onde o casal morava se transformou num verdadeiro quartel-general de repórteres, assim como a clínica.

    No ano anterior, ao presenciar de perto a enorme repercussão da morte de Elis ReginaClara Nunes havia ficado aterrorizada ao ponto de pedir ao marido, ao voltar do velório da amiga, que ele não deixasse que transformassem a morte dela em um espetáculo. No entanto, Paulo César Pinheiro pouco pôde fazer para atender ao pedido da esposa. Dezenas de fãs e artistas aportaram na entrada da Clinica, que seria palco de crises histéricas e orações.

    Clara ao lado de Elis, duas grandes cantoras da MPB

    Dez dias após o início do coma foi descoberta a extensão do edema, quando Clara Nunes foi levada para uma tomografia na Santa Casa de Misericórdia, o que foi feito de madrugada para que não houvesse comoção popular. Naquele momento, chegaram à conclusão de que nada poderia ser feito para evitar a morte iminente da cantora, devido ao tamanho do edema cerebral.

    A imprensa começou a exigir que os médicos concedessem uma entrevista coletiva e que a sala de cirurgia fosse aberta para que fosse concluído se houve ou não falha nos equipamentos usados. Na terceira semana de março, quando o chefe do serviço de anestesia guiou os membros da imprensa pela clínica. Naquela semana, a revista Veja entrevistou uma funcionária do hospital que teria dito que, de fato, faltou oxigênio durante a operação.

    A Morte de fato

    Na madrugada de 02 de abril de 1983, as funções vitais de Clara Nunes começaram a desaparecer. Pouco depois, às 04:30 da manhã, Clara morreria após passar 28 dias em coma.

    A família entrou em contato com o presidente da PortelaNezinho, para que o corpo fosse velado na quadra da escola de samba, em Madureira. De madrugada, as emissoras de rádio anunciaram a morte da cantora e os fãs se dirigiram para a porta da clínica e, posteriormente cerca de 5.000 pessoas foram para a quadra da Portela. A programação das principais redes de televisão do país era interrompida com entradas ao vivo da quadra da escola de samba.

    A partir do momento em que o caixão aberto foi colocado no centro da quadra, alguns tumultos ocorreram. Algumas das pessoas presentes caíram de um palco de cerca de dois metros de altura. Houve correria e truculência dos seguranças da Portela e da Policia Militar. O recinto onde se realizaria o velório foi invadido e o caixão quase foi jogado ao chão. Alguns passaram mal e pelo menos uma pessoa desmaiou por falta de ar. A diretoria da Portela, incapaz de controlar a situação, se refugiou numa sala junto com a família da cantora.

    O compositor viúvo decidiu não abrir um processo para investigar a causada da morte, pois o processo caberia exumar o corpo. Vários outros processos foram abertos por  Conselhos Regionais de Medicina, sempre inocentando a Clínica São Vicente. Mesmo passíveis de recurso, o marido da cantora nunca recorreu, alegando na época que não acreditava na justiça.

    Vestida de branco, sorrindo, gingando e cantando sambas, que Clara Francisca Gonçalves se destacou na MPB. Com uma obra inoxidável e foi sem a menor sombra de dúvida, uma das maiores que a música popular brasileira já viu e ouviu.

    Sabiá
    Que falta faz tua alegria
    Sem você, meu canto agora é só
    Melancolia
    Canta, meu sabiá, voa, meu sabiá
    Adeus, meu sabiá, até um dia

    “Um Ser de Luz” – compositores: Paulo Cesar Pinheiro / Mauro Duarte De Oliveira / Joao Nogueira

    Fontes – Livro Clara Nunes Guerreira da Utopia, Pagina “Clara Guerreira”, Reportagens da época.

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