RJ – Portela 1972 – “Ilu Ayê, a terra da vida”

 

Como já afirmei em muitas outras oportunidades, o carnaval carioca e suas agremiações carnavalescas apresentaram grandes desfiles que ficaram para sempre registrados nas lembranças dos amantes do carnaval brasileiro.

Um destes desfiles foi protagonizado pela Portela no carnaval de 1972, quando a escola apresentou o enredo “Ilu Ayê, a terra da vida”, tema este de autoria de Candeia, Raimundo de Souza, Edson Carneiro e Hiran Araújo e desenvolvido por uma Comissão de Carnaval.
A Portela nunca teve a tradição cultural de arquitetar enredos sobre o povo negro, diferentemente do Acadêmicos do Salgueiro e da Acadêmicos do Cubango.
Para o desenvolvimento deste carnaval, a agremiação passou para seu departamento cultural o encargo de desenvolver um enredo pela primeira vez. Esse departamento na época estava sob a liderança de Hiram Araújo, médico e pesquisador.
Na sinopse construída pelo departamento cultural da Portela para explicar a ideia do enredo proposto para aquele carnaval, uma frase consegue resumidamente explicar a idéia para aquele desfile:
“Este enredo é uma introdução a um estudo vasto e complexo: o Negro na Civilização Brasileira. Com isto a Portela presta uma homenagem a bravura, à coragem, à inteligência, a alegria do negro brasileiro.”

O samba, composto por Cabana, oriundo da então pequena Beija-Flor e Norival Reis teve como puxadores, no desfile oficial, Clara Nunes e Silvinho da Portela.

Ilu ayê, ilu ayê, Odara
Negro cantava na nação Nagô

Depois chorou lamento de senzala
Tão longe estava de sua Ilu ayê
Tempo passou, ô ô
E no terreirão da casa grande
Negro diz tudo que pode dizer

É samba, é batuque, é reza
É dança, é ladainha
Negro joga capoeira
E faz louvação à rainha

Hoje, negro é terra, negro é vida
Na mutação do tempo
Desfilando na avenida

Negro é sensacional
É toda a festa de um povo
É dono do carnaval

Já no último ensaio antes do carnaval de 72, por toda a animação dos componentes portelenses era possível perceber que a escola vinha para realizar um grande desfile.
Portela 1972 – último ensaio
O samba escolhido para musicar este desfile, já bem antes do carnaval fazia muito sucesso nas rádios cariocas, sendo por isso um dos grandes trunfos da escola para fazer bonito na avenida.
A águia de Madureira entrou na pista de desfile como a quinta agremiação à desfilar, tendo Bagda e Irene como primeiro casal de mestre sala e porta bandeira, na condução do pavilhão portelense.

 

Esse desfile deu à Portela seu primeiro Estandarte de Ouro na história da agremiação azul e branca, premiação esta recebida no tocante ao quesito bateria, que na época era comandada por Mestre Cinco.

Natal, que havia sofrido um enfarte pouco tempo antes do carnaval, deixou o hospital onde estava internado para desfilar com a sua Portela, tendo realizado o trajeto do desfile com um médico à frente da escola.

Portela 1972

A Portela desfilou com cerca de 3000 componentes que trouxeram para o desfile da escola todo o misticismo africano, o candomblé e toda a riqueza da cultura afro-brasileira. Logo no início do desfile a chegada dos negros ao nosso país estava pintada numa bela tela.

Tudo aquilo referente à negritude que veio para o Brasil na condição de povo escravizado, como a dor incomparável do banzo, a luta pela preservação das tradições, a resistência negra que saiu vitoriosa mesmo que a chibata tenha trazido muitas dores. Não ficaram de fora do desfile da escola as nações africanas, a casa-grande e a senzala, enfim tudo aquilo que veio como contribuição do negro para a formação do nosso povo.

Já logo que a escola adentrou a passarela, a resposta do público foi logo sentida, entoando com força o samba que todos já conheciam desde o período do pré-carnaval.

Tâmbora Fontinelli, rainha do carnaval portelense, fez bonito juntamente com as passistas da ala do Donga. Beki Klabin, socialite embelezou o desfile com sua fantasia de luxo. O trio formado por Clara Nunes, Vilma Nascimento e o cabeleireiro Silvinho foram figuras de destaque neste desfile.

Imprevistos aconteceram durante o desfile já que algumas alegorias apresentaram problemas no meio da pista de desfile, mas a superação das dificuldades veio através da tomada de decisão imediata dos portelenses.

A última alegoria exibia ao público das arquibancadas, instaladas ao longo da Presidente Vargas, a figura de um Rei Momo, que vinha representando o “dono do carnaval”.

Portela 1972 – Última Alegoria

Terminado aquele desfile inesquecível e abertos os envelopes com as notas dos julgadores, a Portela alcançou ao final da apuração apenas a terceira colocação, tendo o Império Serrano alcançado o ponto mais alto do pódio naquele carnaval.

Nos quesitos alegorias, comissão de frente, harmonia, mestre sala e porta bandeira e conjunto a águia de Madureira não conseguiu alcançar as notas máximas.

Por Sidnei Louro Jorge Júnior

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no whatsapp
WhatsApp