Mantendo a tradição de desfiles potentes e aquecidos, a Vila Isabel fez mais um ensaio no Boulevard 28 de Setembro na ultima quinta feira (23/03). Cientes da responsabilidade de homenagear o seu filho ilustre, o cantor, compositor e baluarte da agremiação Martinho da Vila, a escola da comunidade dos Macacos manteve a garra costumeira e segue como uma das postulantes ao título. Seu ensaio contou, inclusive, com a presença do carnavalesco Edson Pereira. O Mestre de Bateria, Macaco Branco, diz ser a realização de um sonho e se disse confiante na vitória:
“Poder cantar e exaltar o nosso negro-rei, nosso griô, é uma honra! Se Deus quiser estaremos trazendo este presente para ele, que é esse caneco para a Vila Isabel no ano de 2022”
Na noite de ontem, a escola teve o seu pavilhão defendido pelo segundo casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira, Jackson Senhorinho e Bárbara Dionísio. Para o rapaz, além da responsabilidade na homenagem ao cantor, o desfile tem valor de gratidão. O Mestre-Sala reiterou o favoritismo da escola campeã de 1988:
“Modéstia à parte posso dizer que estou nesta agremiação graças à família do Martinho. Sei o quanto este enredo é aguardado pela comunidade, e não só por ela, mas também pela família dele. A Vila está muito aguerrida e confiante de que o título virá”. – Afirmou.
Sua partner, Bárbara, destacou a emoção em defender a bandeira da Vila e salientou:
“Para mim é ainda mais emocionante por conta de eu estar defendendo a minha escola do coração, num ano cujo enredo é o Martinho. É um prazer imenso pisar na principal rua do bairro e estar junto à comunidade em dois ensaios tão aquecidos – mesmo com a chuva que caiu durante o nosso ensaio na semana passada (18/03). Nada foi capaz de fazer a nossa comunidade esmorecer. É algo magnífico”
Afirma Bárbara, que salienta “Linda. Uma das mais bonitas fantasias que já usei”. Segundo ela, a indumentária representa uma parte da vida do homenageado e será confeccionada no ateliê do Fernando Magalhães.
Dois componentes da escola destacam a responsabilidade de colocar o carnaval da escola de pé. Um deles é o diretor da ala de passistas Gabriel Castro, que afirma ser um presente poder dirigir a ala pelo terceiro carnaval “Ainda mais tendo tantos passistas históricos e que já mereceram 8 estandartes de ouro. Coordenar esta ala que abrigou Ciro do Agogô, Dandara, Edson, Aldione…”. Castro também destaca a importância de um personagem como o “Zé Ferreira” como tema:
“Ele é grande mestre tanto para o samba como para o carnaval, assim como para as culturas populares brasileira e angolana. O Martinho é praticamente um orixá para nós. Compartilhar dessa energia, estar com ele, com os familiares dele… É uma emoção muito grande”.
O diretor afirma que sua ala virá retratando um enredo escrito pelo homenageado e cujo samba também foi composto por ele. O dançarino prossegue dizendo que parte da evolução de seu grupo será guiada pela coloratura de sua indumentária.
Em seu primeiro ano como compositor, 1994, André Diniz e seus parceiros citaram Martinho da Vila no hino da agremiação, cujo enredo era o bairro. E a homenagem não ficou restrita àquele carnaval, mas também ao de 2012 quando foi a vez de Angola ser referenciada. Para o artista, a emoção de compor foi muito forte. Tanto que optou por escrever seu samba para além das linhas propostas pela sinopse. “Quis retratar ‘O cara’ que ficava aqui do lado, no Petisco (da Vila – Restaurante), o carinho dele pela família”. Por esta razão André e os outros autores perceberam que a canção foi acolhida pelo próprio músico:
“(Ficamos muito emocionados por conta de) este ser o samba favorito do próprio homenageado. Num momento em que a escola estava tripartite, a escolha definitiva seria dele, que afirmou que o samba que mais o representava era o nosso. Fizemos questão de destacar no samba a questão da proximidade do pertencimento. Tanto que optamos por colocar um apelido de família do primeiro filho do cantor” – Pinduca – cujo nome de batismo é Martinho Antônio, fato que gerou estranheza em outros compositores que desconheciam o apelido.”
Para Diniz, além de todas as camadas que envolvem o desfile, há, também, um elemento maior que transcende a singeleza do protagonista do tema da escola de Noel. É o fato de seu pai, Roberto Diniz, falecido há sessenta dias, não o estar acompanhando – ao menos fisicamente – na passarela:
“Vai ser o meu primeiro desfile sem o meu pai, que me levou para desfilar na Vila em 85. Meu pai vibrava e chorava em todas as vitórias e era apaixonado por esse samba mágico que a gente fez. (…) Tenho a certeza de que ele vai desfilar solto na avenida como sempre ficou e gostou”.
Ao falar do pai, o poeta, dono de tantas palavras, silenciou. Ele sabe que “saudade” é poema que ainda não foi escrito. Para Diniz, memória e saudade, tal qual “os três apitos cantados por Noel” ainda hão de ecoar pela Vila Isabel.
No desfile de Abril, a azul-e-branco da Zona Norte vai apresentar na avenida o enredo “Canta, canta minha gente! A Vila é de Martinho!”, em homenagem ao ídolo da escola, Martinho da Vila.
Por Vitor Antunes